sábado, 22 de março de 2008

Trocando em graúdos

E eu não quero mais pensar.
Chega uma hora em que os neurônios não emitem mais aqueles reflexos rápidos e você começa a repensar as mesmas idéias sempre.
Talvez elas já estejam obsoletas e não se encaixem mais no contexto, mas a gente continua mascando o velho chiclete das idéias marcadas, até ele virar aquela borracha imprestável.
Achamos que é difícil mudar de idéia. Às vezes é, mesmo. Gasta tempo e você tem de se desfazer daquelas velhas premissas arraigadas à sua história.
Tão cômodas..
Tão práticas...
Numa hora de desespero, sem opinião formada, você abre a gaveta dos pensamentos sólidos e escolhe aquele que mais se adequa à situação.
A questão é: será que esse pensamento ainda é compatível com a realidade? Não a da época em que ele foi formado, mas a do momento em que ele foi selecionado.
Vale a pena repensar certas coisas.
E trocar o sabor de nada por um novo recheio de morango.

domingo, 9 de março de 2008

Escovas


Eram dois estranhos.


Desconhecidos de uma vida inteira, que, mais estranhamente ainda, dividiam o espaço das coisas mais íntimas. Pra ela, isso podia ser resumido em um só objeto: a escova de dentes.


Aquele pequeno pedaço de plástico com cerdas continha partes biológicas dela. Era íntimo demais. O potinho de acrílico azul ficava no banheiro que também era dividido por eles. Imóvel. Estático.


Impossível acreditar que aquele local em que nem seu pai entrava ao mesmo tempo que ela, agora era dividido sem pudores aparentes com aquela pessoa. Prazeres particulares, como o café com leite gelado ou sentar na janela e observar os passantes e suas vidas, agora tinham companhia. Não tentava medir a intensidade daquela presença do seu lado. Não fazia julgamentos com direito a céu e inferno: apenas sentia - coisa que, para ela, era a mais difícil de fazer dissociada de outras.


No meio de todos os sentimentos, veio um pensamento que a deixou atordoada: como uma pessoa que não viu seu primeiro tombo e não sabe que ela não gosta do chocolate, e sim das embalagens dos bombons, pode estar na mesma casa que ela e dividir seu porta escovas de acrílico?


Eles passaram mais tempo de suas vidas no anonimato sem graça de quem não tem um par e, agora que estavam juntos, não havia uma cicatriz da infância que tivesse a história dividida. Não tinha um pontinho dos anos de sustentação que tivesse vindo à tona. Apenas vivam juntos, retratando os gostos e desgostos a partir de quando se conheceram.
Mas a escova de dentes continuava ali. Molhada e encostada, como numa espécie de abraço à outra.
O temos pela intimidade que talvez fosse precoce, tomou conta dela. Estava acostumada ao macarrão à bolognesa dominical, mas o único almoço que faziam juntos, era feito em 3 minutos e no sabor legumes. Gostava de dormir com a cabeça coberta, de meias e esparramada, como se ainda vivesse sozinha. O edredom milimetricamente colocado sobre a cama a deixava enervada, e o amargor das manhãs sem companhia também. Lembrou de quando sabia que estava sozinha, e não apenas se sentia.


Pensou que talvez os lugares divididos na mesa e no sofá estivessem ficando com a pessoa errada. “Quem vai saber?”


Caminhou para o banheiro. Olhou o acrílico azul. Estavam lá, as duas. A sua quase seca. Aproveitou o momento, colocou na sua nécessaire e saiu.



Sentiu-se mais íntima de si mesma.

domingo, 2 de março de 2008

Making off

Se a vida tinha trilha sonora, ela era o maior exemplo daquilo.
Ouvia trechos de música, repetia os trechos sempre no mesmo momento e tinha a certeza de que sua vida era um filme, daqueles em que a personagem narra coisas normais em tom de desabafo, com um close gigantesco. A música sobe lentamente e ela já não é mais o foco; as pessoas continuam passando, sem que nada se altere.
Afinal, ninguém sabe que ela é a atriz principal.

Nem ela.

sábado, 1 de março de 2008

Revertendo

Meus revertérios são só meus.
Seria bom que fossem dos outros, também.

(...)
Aqui estamos.